Uma labareda
de fogo surgiu ao meu redor. Permaneci imóvel. Encontrava-me completamente
cercado pelas chamas. Eu não sabia exatamente o que fazer, o calor era muito
grande e atrapalhava os meus pensamentos. Quando fechei os olhos o fogo veio
até mim e tomou conta de cada centímetro do meu corpo.
Mas antes
disso...
― Estou lhe
oferecendo poder, Oliver. Um poder do qual você nunca sonhou. Pegue a Chama Sagrada e será um dos mortais mais
poderosos do mundo! ― exclamou a Salamandra atirando uma bola de fogo para
cima.
― Nunca
desejei todo esse poder. Apenas preciso dele para impedir o fim do mundo, mas
não o quero dessa forma ― declarei.
― Essa é sua
última palavra?! ― questionou a Salamandra.
Dei um passo à frente empunhando a Espada do Oeste. Posicionei-me como um
guerreiro confiante, mesmo estando apavorado com a ideia de enfrentar aquela
criatura milenar.
― Sim!
A elemental pareceu desapontada, mas ao mesmo
tempo curiosa.
― Você gosta tanto assim da garota? ―
perguntou ela mais uma vez.
― Não se trata apenas disso.
― Então o que?!
― Eu faria
isso por qualquer pessoa. Eu não sou nenhum tipo de deus para decidir quem deve
morrer ou viver. Enquanto existir uma chance de salvar alguém, farei isso sem
hesitar ― respondi.
― Mas e o
dragão? ― continuou a criatura com o interrogatório.
Mantendo a
espada erguida olhei diretamente para a elemental. Seus olhos de fogo brilhavam
intensamente, enquanto chamas serpenteavam seu corpo.
― Enfrentá-lo
antes de seu despertar seria o caminho mais fácil, não há como negar. Mas se
for pra salvar a vida de alguém, eu prefiro trilhar o caminho mais difícil ―
expliquei fechando o punho. ― Primeiro salvarei Maia, depois cuidaremos desse
monstro idiota, juntos.
A Salamandra
continuava a me encarar, como se não estivesse acreditando em minhas palavras.
― Você é um
garoto interessante, Oliver Turner. Gostaria de ter mais tempo para conversar
com você. Mas receio que nossa conversa termina por aqui.
Em uma
velocidade que meus olhos não conseguiram acompanhar, ela se transformou em uma
bola de fogo e se lançou sobre mim. Pensei em desviar, mas infelizmente meu
corpo não reagiu. A elemental me acertou diretamente no peito com uma força assombrosa,
o impacto me jogou para trás como um boneco de pano. Meu corpo inteiro reagiu
ao golpe, com dificuldade pus-me de pé novamente, era como se um elefante em
chamas tivesse passado por cima de mim.
― Tem certeza
que não quer repensar? ― perguntou a Salamandra enquanto produzia em suas mãos
bolas de fogo. Ela continuava acesa, a cada segundo que se passava, as chamas
ao seu redor se tornavam mais intensas.
― Já disse
que não! ― gritei.
Não sei até
que ponto podemos chamar isso de coragem, talvez fosse apenas loucura mesmo.
Mas eu não voltaria atrás de minhas palavras, lutaria até o final para salvar a
todos.
― Se você
prefere assim, eu entendo ― disse ela ―, essa luta acaba agora.
A Salamandra
abriu os braços e começou a brilhar com mais intensidade do que antes. Os raios
de luz eram fortes o suficiente para me cegar. Um zumbido agudo tomou conta dos
meus ouvidos e meu corpo começou a formigar, como se estivesse sendo
estilhaçado de dentro para fora. Por um momento pensei que ela tivesse se
autodestruído ― explodindo todo o lugar ―, inclusive a mim.
Abri os meus
olhos devagar. Minha visão
ainda estava turva e meus ouvidos zumbiam.
― Estou
morto? ― perguntei.
― Você tem
que parar de perguntar isso, garoto ― respondeu uma voz conhecida.
― Belenus! ―
exclamei. ― O que...?
Estávamos
mais uma vez no palácio de jogos do deus do fogo, quando os meus olhos voltaram
ao normal, pude vê-lo escorado em uma de suas maquinas de fliperama.
― Você
conseguiu Oliver. Venceu todos os desafios da Chama Sagrada.
Meu estômago
revirou nesse momento, senti uma breve tontura e cambaleei até a poltrona mais
próxima.
― Do que você
está falando? Eu falhei miseravelmente, não consegui nem me mover no último
desafio ― lamentei baixando a cabeça.
― HÁ, HÁ, HÁ! ― gargalhou Belenus. ― A elemental
exagerou um pouco na atuação, talvez você a tenha irritado.
Se eu pudesse
me ver, provavelmente diria que minha expressão era indescritível. As palavras
do deus não faziam sentido, minha mente estava girando como um carrossel
alucinado.
― Não-o ente-endo...
― Permita-me
explicar ― disse Belenus.
Ele estalou
os dedos e outra poltrona apareceu em minha frente, onde se sentou me
encarando.
― Os desafios
eram difíceis, foram feitos para testar todo o seu ser.
― Eu percebi
essa parte ― falei fazendo uma careta.
Belenus
suspirou.
― Espero que
você entenda o porquê dos desafios possuírem tamanha dificuldade. Se fossem
fáceis, qualquer um poderia colocar as mãos na Chama Sagrada ― explicou o deus do fogo.
Mesmo me
sentindo um pouco contrariado, precisei concordar. Ele estava certo referente a
isso, se fosse fácil chegar até a chama, qualquer um poderia pegá-la, inclusive
um certo dragão maligno.
― O primeiro
desafio serviu para testar o seu poder. Felizmente você é meu descendente,
herdou minhas habilidades de combate ― declarou ele fechando o punho. ― Você
passou com louvor, as formigas tentaram, mas foram dizimadas pelo seu poder.
Nesse
momento, como um soco no estômago, lembrei-me de algo.
― Maia! ―
exclamei, pondo-me de pé.
Belenus
levantou a mão e fiz um sinal para que eu me sentasse novamente. Precisei me
controlar para não socar a cara do deus.
― O segundo
desafio era para testar a sua inteligência. Somente os sábios poderiam chegar
até a Chama Sagrada ― explicou ele. ―
Você demonstrou possuir essa capacidade, mesmo que não a use com frequência.
― Hey...
― E por fim,
o último desafio.
― O fracasso ―
falei.
― Pelo
contrário, Oliver.
― Como assim?
― perguntei franzindo o cenho.
― Muito bem,
vou lhe dizer. Mas... ― ele fez uma pausa e olhou ao redor ― não prefere jogar
uma partida de bilhar antes?
― NÃO! ―
exclamei.
Ele bufou e
revirou os olhos.
― Você sabe
que não tenho muita companhia por aqui, não sabe? Os outros deuses possuem
gostos diferentes e não costumam vir me visitar.
Os deuses
eram na maioria das vezes egocêntricos e egoístas, mas admito que dessa vez
senti um pouco de penas de Belenus. Não deve existir nada mais triste do que
viver para sempre, mergulhado na solidão, mesmo que você seja um deus.
― Ahn... ―
suspirei ― Tudo bem, mas vamos fazer assim: depois que isso tudo acabar,
prometo que voltarei aqui para jogarmos uma boa partida de bilhar.
Por alguns
segundos ele me analisou seriamente, mas logo abriu um sorriso amistoso.
― Perfeito!
Depois de sua batalha com Rendar, irei lhe ensinar o bilhar dos deuses. Se você
sobreviver, é claro.
― Nossa!
Obrigado por me lembrar dessa incrível possibilidade.
― De nada,
mas vamos ao que interessa ― disse o deus do fogo sem entender a ironia em
minhas palavras. ― Sabe aquela história de luta com a Salamandra? Tudo papo
furado, o desafio não era esse.
― O que?! ―
questionei me sentindo extremamente desconfiado.
― O desafio
final, nada mais é do que um teste de caráter.
Continuei em
silêncio, esperando que ele explicasse melhor as coisas.
― Pense
Oliver. A elemental lhe ofereceu o poder absoluto da Chama Sagrada de bom grado, tudo que você precisava fazer era
deixar sua parceira morrer. O que você acha que um homem de má índole faria em
seu lugar?
― Err...
deixaria o parceiro morrer?
― Exato! ―
exclamou o deus ― Esse era o verdadeiro desafio, aqueles que possuem sede de
poder, perecem.
Endireitei-me
na poltrona e com os olhos arregalados perguntei:
― Isso que-er
diz-zer que... que-e eu consegui?
― Isso mesmo.
Em mil anos, você foi o único que conseguiu chegar até a Chama Sagrada ― concluiu Belenus.
Ele se
levantou e deu a volta na minha poltrona, quando tocou no meu ombro tudo ao
nosso redor desapareceu. Em um piscar de olhos não estávamos mais no playground
do deus do fogo e sim em uma caverna. Encontrávamo-nos aos pés de uma
escadaria, talvez uns trinta degraus para cima. No último degrau era possível avistar
uma chama azul crepitando com grande intensidade.
Eu estava
perplexo com aquela visão, era diferente de tudo que eu já havia visto. Era
lindo. Era perigoso. Era poderoso. O fogo começou a descer as escadas
lentamente, deixando um rastro azul brilhante para trás.
― Você é
merecedor, Oliver Turner. Receba sua recompensa, a Chama Sagrada.
Uma labareda
de fogo surgiu ao meu redor. Permaneci imóvel. Encontrava-me completamente
cercado pelas chamas. Eu não sabia exatamente o que fazer, o calor era muito grande
e atrapalhava os meus pensamentos. Quando fechei os olhos o fogo veio até mim e
tomou conta de cada centímetro do meu corpo.
No inicio
doeu um pouco, mas alguns segundos depois a dor se transformou em alegria. Era
como se o fogo e eu nos tornássemos um só. Eu podia senti-lo em cada parte do
meu corpo, mas ao invés de queimar, ele estava me fortalecendo.
Todo aquele
fogo foi absorvido para dentro de mim, até não sobrar nenhuma faísca no chão.
Quando percebi que as chamas haviam desaparecido, abri os meus olhos.
Eu estava
literalmente em chamas.
― Como se sente? ― perguntou Belenus.
Olhei para a
palma das minhas mãos, estavam pegando fogo, levemente essas chamas se apagaram
e eu voltei ao normal. Mas ainda sentia uma fonte inesgotável de poder fluindo dentro
de mim.
― Estou me
sentindo ótimo! ― exclamei fechando o punho, nesse momento ele voltou a pegar
fogo. Quando relaxei, a chama se extinguiu.
― É... parece
que você está pronto para sua missão agora ― disse o deus do fogo.
― E Maia?! ―
questionei.
― No seu
bolso ― disse ele apontando para mim.
Tateei meu
bolso e encontrei um pequeno frasco, contendo um liquido roxo brilhante.
― O antídoto!
O deus do
fogo apenas assentiu.
― Agora você
precisa ir, o tempo realmente está se esgotando. Encontrará a garota no lado de
fora da caverna. Use este portal para chegar até mais rápido ― concluiu o deus
estalando os dedos e fazendo surgir um circulo luminoso ao meu lado. ― Boa
sorte, Oliver Turner.
Encarei o
portal com um sorriso travesso no rosto, dessa vez estava me sentindo confiante
de verdade.
― Está na
hora de caçar um dragão mal criado!
Leia também no WATTPAD
ConversãoConversão EmoticonEmoticon