Quer um
conselho? Nunca negocie com um elfo
comerciante. Você sempre sairá
perdendo.
— E então?!
— questionou Steve, vidrado na minha espada.
— Você está
blefando — afirmei, colocando a espada para trás.
— Óoh! —
exclamou a pequena criatura, colocando as mãos no peito. — Assim você me ofende,
sou um elfo honesto!
Era difícil
acreditar. A grande profecia… incompleta. Mas ele não parecia estar brincando e
nem mesmo mentindo sobre isso — a não ser que além de comerciante, Steve fosse
um ótimo ator.
— Supondo
que essa história maluca, seja verdade — disse eu. — Como isso aconteceu?
— A memória
dos humanos é péssima. A profecia foi escrita há apenas mil anos, e ninguém
mais se lembra — declarou o elfo.
Há apenas mil anos. Ele estava tirando uma comigo?
— Mas como
que algo assim se perde? — perguntei. — Digo, é a grande profecia. Ela é
importante.
O elfo
gargalhou, caindo para trás.
— Nem sempre
foi assim, garoto — respondeu ele, ainda rindo. — Quando os deuses aprisionaram
os dragões e escreveram a profecia, os humanos estavam em festa. Finalmente as
bestas tinham sido derrotadas. Por muitos anos, eles a levaram como versos de
uma poesia qualquer.
Steve andava
de um lado para o outro, gesticulando o tempo todo.
— Eles a
ignoraram, nem se esforçaram para entendê-la. Nem se preocuparam em guardá-la — continuou o elfo dando
ênfase na última palavra. — É claro que depois de um tempo, eles perceberam que
ela era real. O mal estava crescendo novamente, mas era tarde demais. Nenhum
homem vivo se lembrava da profecia inteira. Então os humanos se agarraram no
que sabiam e guardaram esses versos que você conhece, deixando o resto para
trás, perdido no esquecimento.
A história
realmente fazia sentido. A maioria dos humanos só percebe o problema, quando
ele bate na porta. Quando as coisas estão bem, ninguém se importa com o que
pode acontecer no futuro. Os deuses afirmaram que o mal iria renascer e o que a
humanidade fez? Nada. Encararam os versos da profecia como uma simples poesia.
E dizem que eu sou lerdo.
— E então?!
— insistiu o elfo. — Temos um acordo?
Olhei para a
minha arma, a Espada do Oeste era
sagrada. Foi usada pelo próprio Belenus há mil anos, quando ele aprisionou o
dragão do fogo. Não poderia simplesmente entregá-la para um colecionador
compulsivo.
— Eu não vou
lhe dar a espada — concluí.
— Então não
temos mais o que conversar — declarou o elfo, virando-se e ameaçando ir embora.
Provavelmente
era uma técnica de comerciante. Primeiro me convenceu que tinha algo que eu
precisava. Depois ressaltou a raridade desse item e seu grande valor. Agora
está agindo indiferente, querendo me manipular, como se falasse: tudo bem fique com a espada, quem vai sair
perdendo é você.
— Espere! — chamei me colocando de pé. — Ele olhou por cima do ombro, com um
olhar arrogante. — Talvez possamos negociar com outra coisa... — falei.
Ele me
encarou, avaliando-me. Um sorriso surgiu no canto de sua boca. Eu não posso ler
mentes, mas tenho certeza que ele pensou: sim,
finalmente esse idiota mordeu a isca.
— O que você tem para me oferecer, jovem guerreiro?
Abri minha
mochila e comecei a tirar algumas coisas de dentro.
— Que tal
esse belo manto de rinoceronte? — questionei, mostrando a pele de Rhinoceros. —
Veja bem: ele é a prova de fogo, pode ser útil caso um dragão maligno queira queimá-lo. E o melhor de tudo, combina com
qualquer peça de roupa.
Steve pareceu
interessado. Era um item raro, ninguém havia sobrevivido à tentativa de
pegá-lo.
— Hum…
admito que seja um artigo interessante. Mas duvido que aguente as chamas desse dragão que não falamos o nome —
afirmou o elfo. — Tem mais alguma coisa?
Larguei o
manto ao lado e continuei tirando minhas coisas da mochila.
— Já sei.
Quem sabe um cantil mágico? — perguntei, mostrando um dos itens do Sr. Stone. —
Imagine que você está andando por um longo deserto, com sede. Esse cantil
salvará sua vida, pois a água dentro dele nunca termina.
Dessa vez os
olhos do elfo brilharam, mas foi por apenas alguns segundos.
— Err… até
que seria útil em minhas viagens. Mas não vale o preço da profecia.
Esse era
mais um dos truques de negociador dele. Estava desvalorizando minhas coisas,
como se nada que eu pudesse oferecer fosse bom o suficiente.
— Tudo bem —
suspirei. — Talvez uma barraca especial… dentro dela você ficará protegido das
criaturas malignas.
Outro item
mágico recebido pelo Sr. Stone. Se o velho soubesse que eu estava usando suas
coisas como moeda de troca, certamente ele tocaria seu avião velho em cima de
mim.
— Me parece
uma ótima proteção mágica — disse o elfo segurando a barraca desmontada. — Mas…
Hum… A profecia é importante... Não tem mais nada? — questionou ele se
inclinando para ver dentro da minha mochila.
Suspirei
mais uma vez.
— Okay,
Steve. — Mostrei meu dedo do meio para ele, mais precisamente o anel mágico (óh... você não pensou que... pensou?) —
Esse anel se transforma em um escudo, seu metal é o mais resistente do mundo.
— Ah… não
sei. Ainda me parece pouco — disse o elfo examinando meu anel mágico. — O que
mais você tem?
Ele estava
conseguindo me irritar.
— Que tal se
eu não matá-lo? Confesso que nesse
momento está difícil me controlar — declarei mexendo minha espada. — Será que
isso conta como algo raro?
O elfo
soltou um grunhido de pavor.
— Justo! —
exclamou ele. — Parece que temos um acordo. Todas essas coisas pela profecia
completa. Excelente, você sabe mesmo como negociar.
Steve bateu
palmas e um pedaço de papel antigo surgiu em minhas mãos. No mesmo instante
minhas coisas desapareceram, sem deixar rastros. Eu não queria nem imaginar
onde ele guardava mais de mil anos de quinquilharias, o lugar deveria ser maior
que um estádio de futebol e mais bagunçado que o meu quarto.
— Foi bom
negociar com você, garoto — disse o elfo fazendo uma reverência. — Pegue meu
cartão, caso um dia mude de ideia sobre a espada.
Peguei e
guardei o cartão de visitas, que estava escrito: o maior elfo comerciante do mundo.
— Antes de
ir, diga-me: como conseguiu isto? — perguntei mostrando o pedaço de papel
antigo.
— Eu troquei
com Belenus por uma mesa de bilhar, feita pelos vikings é claro. A primeira da
história. As bolas eram de pedra e os tacos feitos com ossos de guerreiros
mortos em batalha. Artigo de luxo! — explicou o pequeno elfo.
É claro...
com Belenus não poderia ser diferente. Lembrei-me da última vez que estive no
palácio do deus do fogo, a mesa de bilhar era nova e normal. Fiquei feliz por
ele ter substituído a antiga, seria nojento segurar tacos feitos com ossos de
gente morta.
— Muito bem,
agora preciso ir embora mesmo — disse Steve. — Ouvi falar de um machado muito
raro, na Noruega — acrescentou o elfo colecionador, antes de bater palmas e
desaparecer.
Olhei para o
pedaço de papel em minhas mãos, estava plastificado como uma daquelas edições
raras de histórias em quadrinhos. Talvez os vikings também lessem HQs, enquanto
tomavam refrigerantes e jogavam bilhar.
Com muito
cuidado, removi o plástico protetor. A princípio estava escrita em uma
linguagem estranha para mim. Antes que eu pudesse reclamar, as letras se
adaptaram aos meus olhos, como se alguém tivesse usado um tradutor automático.
Então
consegui ler perfeitamente:
Quando o mal renascer,
Um novo guerreiro deve crescer.
A luz o seu caminho guiará,
E seu futuro ele mesmo fará.
O herdeiro do dragão lutará,
Ao lado de seu pai vencerá.
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