Capítulo vinte - Falei demais, mas dessa vez foi bom




Tudo ao meu redor pareceu ficar em câmera lenta. Por alguns instantes esqueci o motivo de estarmos ali. Nada mais importava, o mundo está acabando? Eu sei. Mas as circunstâncias me fizeram esquecer esse detalhe. Eu estava segurando em meus braços uma amiga, e ela estava morrendo.


― Não! Não!  ― Tentava de todas as formas lhe acordar, mas ela não respondia a nada. ― Isso não pode estar acontecendo!


Mesmo desacordada ela suava e se contraia de dor. O veneno estava se espalhando por seu corpo rapidamente. Maia murmurava algumas palavras sem nexo, provavelmente algum tipo de delírio febril. A ferida ficava cada vez pior, as marcas verdes estavam se alastrando e tomando conta de seu braço.


Montei nossa barraca a prova de monstros e a coloquei deitada no interior. Se as criaturas voltassem, pelo menos Maia estaria protegida. Tentei colocar meus pensamentos em ordem, precisava agir imediatamente, antes que fosse tarde demais.


― Belenus! É isso! ― O deus do fogo me ajudou durante a batalha, me emprestou parte de seu poder. Talvez pudesse fazer alguma coisa para salvar Maia.


― Belenus?! ― gritei. ― Eu preciso de ajuda!


Mas não ouvi nada. Nenhuma voz falou em minha mente dessa vez. Não importava o quanto eu gritava, Belenus simplesmente não respondia. Provavelmente estava muito ocupado jogando seu videogame.


― Droga, Belenus! ― Eu estava fazendo um grande esforço para conter as lágrimas. Conheço essa garota há pouco tempo, mas posso afirmar com certeza que, Maia é importante para mim, não quero perde-la.
 

Sentei-me ao lado dela, segurando firmemente suas mãos.


Meus olhos estavam cheios de lágrimas, coração acelerado e quase saindo do peito. Desde o inicio eu sabia que essa missão seria perigosa, sempre tive em mente que estávamos correndo um risco muito grande. Mas agora percebo que não estava preparado de verdade para algo assim. Se perdesse Maia, não saberia o que fazer.


― Não ouse morrer agora engraçadinha  ― implorei acariciando delicadamente seu rosto pálido. Ela continuava queimando de febre e seu braço esquerdo havia sido consumido totalmente pelo veneno do Ettercap.


Eu não sabia se ela podia me ouvir, mas ainda assim continuei falando sem parar.


― Você se lembra da profecia? ...um novo guerreiro deve crescer... a luz seu caminho guiará ― lembrei dos versos que ela mesmo recitou há alguns dias, quando nos conhecemos. ― Se eu sou esse guerreiro... você é a minha luz. Preciso de você.


Sua mão direita se fechou sobre a minha, com um suspiro profundo ela abriu os olhos lentamente.


― Maia! Você...


― Me-e de-esculpe... ― Ela mal conseguia balbuciar algumas palavras.


― Do que você está falando, isso não foi culpa sua.


― Eu-u ba-aixei a guarda, Olive-er. ― As palavras pareciam sair com sofrimento e dor. 


― Não! Não, mesmo. De forma alguma a culpa é sua, Maia.


― Ma-as...


― Mas nada. Apenas me diga, existe um antidoto para isso?


Maia hesitou por alguns segundos.


― Existe si-im, Olive-er. Ma-as você não o enco-ontrará aqui em ba-aixo.


― Eu vou salvá-la, de alguma forma...


― Continue a missão ― disse ela me interrompendo. 


― O que? Você está louca? Deve estar delirando por achar que eu lhe deixaria morrer aqui.


― E-eu ainda tenho a-algumas horas. Salve-e o mundo e depo-ois venha-a me buscar ― disse Maia com uma expressão seria no rosto.


As lágrimas voltaram a lutar para sair dos meus olhos. 


― E se for tarde demais? 


― Olive-er...


― Eu não quero que você morra, Maia.


― Oliver...


― Precisamos ficar juntos, lutar juntos.


― Olive-er! ― exclamou ela, sem muitas forças.


― Ora, o que foi? ― perguntei limpando meus olhos marejados.


― Ve-enha a-aqui ― disse ela me chamando mais perto ―, você fa-ala demais, sa-abia? 


Então ela fez algo que eu não esperava, mas há muito tempo desejava. Ela me beijou. Por alguns instantes esqueci que ela estava morrendo, nada mais importava além daquele momento épico. O beijo durou apenas alguns segundos, mas foram os melhores segundos da minha vida.


― Toda vez que eu falar demais, você vai me beijar? ― perguntei olhando nos seus olhos. ― Porque eu posso ser muito tagarela.


Ela sorriu.


― É muito bom ver esse sorriso, Maia.


― Agora-a vá, Olive-er... 


― Pode deixar, engraçadinha. Mas eu voltarei em breve, agora você me deu mais um motivo para não lhe deixar morrer.


Fechei a barraca ao sair, dentro da tenda mágica ela estaria segura. Eu estava determinado e confiante. Caminhei até uma das portas da arena, não possuía mais um GPS para me guiar labirinto adentro. No entanto, eu tinha certeza que podia fazer isso. 


Antes de atravessar o grande portal de pedras que escolhi, olhei para trás. Ainda era possível ver a barraco onde deixei Maia repousando.


— Aguente firme. Vou terminar esse desafio, matar um dragão e salvar a minha garota. E não vou falhar. Eu prometo.


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