Capítulo dezoito - Passamos por um liquidificador gigante




― Eu escolho o portal...
Alguma coisa me dizia que não faria diferença alguma a minha decisão, qualquer uma das três portas seria, de fato, uma péssima escolha. Entretanto alguns fatores eliminaram dois dos portais. O primeiro deles foi o que levava a Floresta das Sombras, motivo: eu estava farto de florestas. Para chegarmos até aqui, tivemos que atravessar uma mata muito densa, que por sinal era o território de diversos monstros irritantes ― sem falar nos mosquitos, terríveis. Com certeza eu não estava a fim de repetir essa experiência.
O outro portal que decidi eliminar foi o Abismo do Medo, por motivos óbvios: quem gosta de abismos? Ninguém em sã consciência escolheria se lançar em um abismo, seria loucura ― até mesmo para nós.
Por fim ―, mas não menos pavoroso ― sobrou o Labirinto do Caos.
― O labirinto ― disse eu, olhando para Maia. ― Você concorda?
― É claro, por que não? ― declarou ela.
Eu poderia jurar que, de relance, vi um sorriso no rosto da Salamandra. Talvez ela estivesse tramando algo. Poderíamos estar caindo como patinhos em uma armadilha mortal, no entanto, que escolha tínhamos? A Chama Sagrada estava em algum lugar além daqueles portais, e a única coisa que nos restava era procurar, mesmo que isso fosse arriscado e assustador.
― Saibam que vocês não são os primeiros a vir em busca da chama, no passado muitos tentaram, porém todos falharam. O desafio irá testá-los de várias formas, sem duvidas não será fácil ― advertiu a Elemental.
― Nossa, obrigado pelas palavras estimulantes, ― falei ― agora estou me sentindo bem mais confiante.
― Vamos Oliver, o tempo está se esgotando ― disse Maia me puxando pelo braço, em direção ao portal do Labirinto do Caos.
As nossas costas pude ouvir a voz da Elemental do fogo dizendo mais algumas palavras: ― Oliver Turner, que os deuses o protejam! Enquanto a você garota, espero que...
Um círculo brilhante surgiu em nossa frente, imediatamente alguma coisa nos puxou para dentro dele, tornando inaudíveis as últimas palavras da Salamandra.
Você deve estar pensando: que legal, como eu gostaria de atravessar um portal mágico! Não, definitivamente você não iria querer passar por isso. A primeira impressão era que tínhamos sido jogados dentro de um liquidificador gigante, tudo estava girando em alta velocidade ao nosso redor, antes que meu cérebro explodisse eu fechei os olhos. E ainda tinha aquele som ensurdecedor ― parecia que estávamos cercados por milhares de motosserras barulhentas. E como se não bastasse, a aterrissagem foi muito ruim. O portal poderia simplesmente se abrir no chão, onde sairíamos caminhando através dele. Mas por algum motivo surgimos a uns três metros de altura, e despencamos até o solo. Dessa vez, nem mesmo Maia conseguiu cair com pose, ambos encontramos o chão de maneira idêntica ― e não foi uma maneira agradável.
Eu estava tonto, demorei alguns segundos para me recompor. Minha cabeça ainda girava como se estivesse dentro do portal/liquidificador. Maia não estava melhor do que eu, ao tentar levantar ela abraçou sua barriga e começou a vomitar.
Somente depois da tontura se esvair, que percebi que estávamos cercados por longas paredes de pedra, sem saída para ambos os lados e nem para trás, tendo como única opção: seguir em frente.
Ao conseguir levantar, caminhei até Maia e lhe ajudei a se erguer também.
― Você está bem? ― perguntei, lhe estendendo a mão.
― Vou ficar ― respondeu ela, se apoiando em meu corpo para ficar de pé. ― Não estou acostumada a usar portais mágicos.
Se ela não estava acostumada com isso, quem dirá eu ― pensei.
Até estarmos prontos, ficamos parados na entrada do labirinto. Verificamos nosso equipamento e tudo estava certo. Eu ainda usava a minha pulseira que se transformava em um escudo de carbino, e tinha em mãos o cantil com a água que nunca terminava. Na mochila de Maia, ainda tínhamos uma barraca invisível para monstros e o manto a prova de fogo do Rhinoceros. Além, é claro, de nossas armas habituais.
― Que tipo de desafios você acha que encontraremos lá na frente? ― perguntei, antes de começarmos a caminhar labirinto adentro.
― Eu não tenho ideia ― respondeu Maia ―, mas vindo daquela Elemental idiota, com certeza não será coisa boa.
Isso me fez lembrar do atrito entre Maia e a Salamandra, elas nem se conheciam e no momento em que se cruzaram, começaram a brigar.
― Falando nela... pode me dizer o que aconteceu lá trás? ― questionei, enquanto dávamos os primeiros passos dentro do labirinto, as paredes altas se erguiam de ambos os lados, nos levando ― por enquanto ― em linha reta.
Maia suspirou. ― É uma longa história Oliver, eu sabia que não iria gostar dela, mas não imaginei que ficaria impulsiva daquela forma.
― Você sabia? Não estou entendendo.
― Você lembra do que ela me chamou? ― indagou Maia.
Garotinha...
― NÃO! ― exclamou ela dando um soco no meu braço ― depois disso.
― Filha da água?
― Exatamente ― afirmou ela. ― Assim como você, eu sou uma caçadora de dragões, descendente de um dos deuses, que no caso é Proteu, o deus da água.
Eu nunca havia parado para pensar sobre isso, Maia também era uma caçadora de dragões, o que indicava que ela foi escolhida por um dos deuses. Ela era filha do deus da água, isso explicava a hostilidade entre as duas garotas, fogo e água realmente não se misturam.
― Agora as coisas fazem sentido ― falei ―, mas...
― Mas o que? ― perguntou ela, franzindo o cenho.
― Bem... eu sou descendente do deus do fogo... e você do deus da água...
― Não se preocupe Oliver, com você é diferente.
― Por quê?
― Por que eu gosto de você senhor teimoso, somos amigos ― concluiu ela com um sorriso nos lábios.
Talvez eu tenha ficado corado, mas eu disse talvez.
― Isso também explica por que a Salamandra estava dando em cima de você ― acrescentou Maia.
― O que?! É claro que não! ― exclamei.
― Oliver... é preciso ser cego, surdo e mudo para não perceber que ela estava dando em cima de você ― insistiu Maia.
― Espera um pouco... você estava com ciúmes da Elemental? ― indaguei.
Maia estreitou os olhos e me esmurrou novamente. ― Mas é claro que não! Eu estava apenas querendo defender um amigo, aquela mulher não é nada confiável.
Dessa vez foi a vez dela enrubescer. 
― Está bem, está bem. Eu estava brincando. Mas não precisa se preocupar engraçadinha, na verdade eu... ― parei de falar quando chegamos ao fim do caminho que estávamos percorrendo. As altas paredes de pedra terminavam em algum tipo de arena, cercada por diversas portas de variados tamanhos. Lembrava muito o coliseu em Roma, onde antigamente os gladiadores se enfrentavam, ou lutavam contra feras selvagens.
Permanecemos parados na entrada da arena, até então tínhamos andado apenas em linha reta, e agora provavelmente teríamos que escolher uma daquelas portas. Bem, se não nos perdêssemos, não seria um labirinto.
― E agora? ― perguntou Maia.
― Eu tenho um plano. Ou você acha que escolhi o labirinto à toa? ― não esperei ela responder, tirei da mochila nosso GPS mágico e o ativei. Uma luz branca iluminou sobre a tela, e uma seta apontou para uma das portas. ― Viu? Sou um gênio ou não...
GRRRRHHAAAU!
Alguma coisa rugiu e saltou sobre mim, arrancando o GPS das minhas mãos e o esmagando no chão. Era uma criatura magricela e feia, era humanoide, mas tinha antenas e mandíbulas iguais às de uma formiga, e na parte de trás carregava o que poderia ser um ferrão. 
― Mas o que... ― antes que eu pudesse concluir a frase, todas as portas se abriram, e de dentro delas começou a sair um exército de formigas monstruosas.


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