Capítulo quatorze - Comemos peixe com o papai noel havaiano










Ainda era cedo, alguma coisa perto de dez horas da manhã, o GPS mágico era um aparelho incrível — uma mistura de tecnologia com magia — ele nos mostrava o caminho para a Chama Sagrada, e às vezes indicava alguma lanchonete próxima, mas não mostrava as horas. O sol estava brilhando com grande intensidade, alguns jovens corriam para o mar com suas pranchas de baixo do braço, as lojas de souvenires eram tomadas por pessoas com camisas floreadas, colar de flores, shorts e chinelos de dedo, — isso parecia algum tipo de uniforme, pois quase todos usavam esse mesmo estilo de roupas — talvez fossem turistas, ou quem sabe os havaianos se vestissem dessa forma mesmo. Era mais um dia comum no Hawaii, exceto pelo fato que o vulcão Kilauea estava prestes a entrar em erupção, trazendo consigo um dragão antigo e maligno que está pronto para destruir toda a ilha e depois o mundo. Bem, se não fosse por isso, seria um lindo dia.
Deixamos a base da barreira do Oeste há algumas horas, e não paramos nenhum minuto para descansar. Conseguimos sair da floresta sem encontrar nenhum outro monstro assassino. O GPS nos guiou até um pequeno vilarejo perto da praia, era um lugar adorável, e as pessoas eram muito receptíveis e gentis. Passamos por um quiosque de madeira com telhado de palha, onde um senhor de meia idade assava alguns peixes. Ele tinha uma longa barba branca, que lembrava muito o papai noel, entretanto ele estava vestindo o uniforme padrão havaiano. Logo o aroma agradável que emanava da churrasqueira lembrou-me que eu estava faminto, e ao observar a expressão no rosto de Maia, constatei que ela também estava. Desde a noite anterior, não havíamos comido nada, se não comecemos alguma coisa logo, talvez morrêssemos antes mesmo do mundo acabar. Mas caçar dragões não é a profissão mais rentável do mundo — na verdade não temos renda alguma — então estávamos meio que... sem dinheiro. Meio que sem perceber, ou hipnotizados pelo cheiro do peixe, nós paramos em frente ao quiosque. O papai noel havaiano aproximou-se de nós com um sorriso acolhedor no rosto.
— Sejam bem vindos ao Peixe Assado do Tio Glauco! — disse o bom velhinho. — Vocês parecem estar com muita fome.
Ou o Tio Glauco podia ler mentes, ou ele ouviu o barulho dos nossos estômagos implorando por comida.  A segunda opção era a mais provável, pois se ele pudesse ler nossas mentes, logo saberia que não tínhamos nenhum dólar no bolso.
Hãa... é que... não temos dinheiro senhor — falei sentindo uma mistura de vergonha e frustração.
Tio Glauco nos olhou com um olhar de compaixão, como se soubesse de nossa missão e de alguma forma sentisse pena de nós.
— Vamos Oliver, precisamos continuar. Não temos tempo — disse Maia com uma voz fraca.
— Esperem... — chamou o velhinho dos peixes. — Entrem e comam o que quiserem. Todos os dias o mar me abençoa com ótimos peixes sem me cobrar nada por isso. Se vocês estão com fome, ficarei feliz em lhes ajudar — concluiu o papai noel havaiano com um largo sorriso no rosto.
Maia e eu nos entreolhamos, tivemos uma pequena conversa silenciosa, não estávamos acostumados com tamanha generosidade, e também o tempo estava contra nós, mas a fome acabou falando mais alto. Entramos e nos servimos do que posso dizer que foi o melhor peixe assado que eu já comi.
— Está fantástico senhor Glauco! — disse Maia entre uma mordida e outra.
— Esfá mais fe fanfásfico, esfá senfáfional — disse eu com a boca cheia de peixe.
O velho senhor parecia achar graça de tudo isso, enquanto comíamos ele sorria ao nosso lado.
— Que bom que vocês gostaram. Mas me digam, o que dois jovens fazem sozinhos por aqui? — perguntou ele acariciando sua longa barba branca.
Eu gostaria de ser honesto com o velho senhor, mas se eu falasse a verdade certamente ele acharia que éramos loucos.
— Bem... nossos pais estão hospedados aqui perto, saímos para caminhar e acabamos nos perdendo — disse eu inventando uma história convincente. — Mas agora está tudo bem, eles estão vindo nos buscar.
Talvez a minha história não tenha sido convincente como eu pensei que seria. O senhor Glauco nos encarou com uma olhar desconfiado, mas por fim decidiu não questionar.
— Que bom que está tudo bem agora — disse ele com uma expressão preocupada no rosto — esse não é o melhor lugar para crianças andarem sozinhas. Existem lendas sobre esse vilarejo, coisas estranhas acontecem por aqui.
Se eu fosse um garoto normal poderia ter me assustado com isso, mas nos últimos dias vivenciei coisas que deixariam os cabelos e a barba do senhor Glauco em pé.
— O senhor poderia nos contar sobre essas lendas? — perguntei. Maia me encarou sem entender o porquê de eu querer ouvir esse tipo de história. Mas os olhos do senhor Glauco eram suplicantes, ele não parecia ter muitos amigos por aqui, ele queria apenas alguém para ouvir suas histórias, e depois do que ele fez por nós, eu não poderia lhe negar isso.
Ele abriu um sorriso maior ainda e aproximou-se, puxou uma cadeira e sentou entre nós. — Muito bem crianças, preparem-se para conhecer a verdade sobre o Vilarejo Abandonado — disse ele com bastante ênfase nas últimas palavras. A lenda diz que há muitos anos atrás esse vilarejo era habitado por criaturas mágicas...
Ao ouvir essas palavras, comecei de certa forma a me interessar de verdade pela história, até mesmo Maia, que a pouco não demonstrava interesse algum em ouvir os contos do papai noel havaiano, agora ficou atenta a essas palavras.
— Eram criaturas de todos os tipos, uma grande diversidade de raças, mas todas compartilhavam de uma mesma característica: a maldade. Eles se divertiam em machucar os outros, atraíam humanos para o vilarejo e depois os torturavam até a morte. É claro que com o tempo, os humanos deixaram os arredores e não apareceram mais, os monstros descontentes começaram a brigar entre si, e aos poucos foram se matando e desapareceram.
Ãah... se eles desapareceram, então acho que não temos com o que nos preocupar, não é? — perguntei após ouvir tudo.
— A história não acaba assim meu jovem — explicou ele. — Quando os monstros desapareceram, os humanos voltaram e encontraram o vilarejo abandonado. Logo eles se instalaram por aqui, e expandiram a vila, criaram comercio, e o vilarejo ficou conhecido e cada vez mais populoso. Mas o que ninguém sabia era que nem todos os monstros tinham desaparecido...
— Essa não... — lamentei.
— Um deles estava vivendo em uma caverna próxima ao vilarejo. Ele era conhecido como Rhinoceros, era um humanoide com a aparência de um rinoceronte, carregava sempre consigo um machado enorme e sua pele era imune ao fogo. Essa noticia se espalhou pela vila, um homem movido pela ganância decidiu caçar o monstro e arrancar sua pele imune ao fogo para vendê-la.
— Imune ao fogo? — perguntou Maia. Por alguns segundos nos entreolhamos, se essa lenda fosse verdade, seria muito útil em nossa jornada. — E o que aconteceu com esse homem senhor Glauco?
— Ele foi trucidado minha jovem, o monstro era muito poderoso. A criatura entendeu isso como uma ofensa e amaldiçoou esse vilarejo, de tempos em tempos ele volta para matar algumas pessoas, somente pela ousadia daquele homem.
 Tio Glauco nos observou com satisfação, nossos rostos estavam perplexos. Mas não estávamos assustados como ele estava imaginando, na verdade estávamos pensando se isso poderia ser verdade, uma pele imune ao fogo... isso poderia ser útil de varias formas.
— Fiquem calmas crianças, isso é apenas uma lenda — disse ele com uma voz tranquilizante.
Com um sorriso no rosto terminamos o nosso peixe, mas agora sem parar de pensar no Rhinoceros, e sua pele mágica. Antes de nos despedirmos do bom velhinho, nós o ajudamos a lavar os pratos, era o mínimo que podíamos fazer depois da refeição gratuita, e a história reveladora. Após a despedida, voltamos para a nossa aventura. O GPS apontava para o oeste, precisaríamos de fato atravessar o vilarejo para seguir o caminho da Chama Sagrada.
— O que você acha dessa história? — perguntei a Maia enquanto caminhávamos, agora descansados e bem alimentados.
— Acho que pode ser verdade sim — respondeu ela. — Eu cresci em um mundo encantado Oliver, e uma coisa eu aprendi sobre lendas, na maioria das vezes, elas são reais.
Talvez isso fosse perigoso, e pudesse nos atrasar ainda mais. Mas uma pele imune ao fogo nos daria uma boa vantagem em nossa missão. — Então nós precisamos encontra esse Rhinoceros e acabar com ele, além de estarmos ajudando o pessoal dessa vila, vamos estar nos fortalecendo para o que está por vir... — dizia eu até uma voz grave e imponente me interromper.
Parece que vocês estão com sorte... mas vamos ver até quando ela vai durar.



Leia também no WATTPAD
Proxima
« Anterior
Anterior
Proxima »
Obrigado pelo seu comentário